Nas ruas ele é um modelo inconfundível, todo brasileiro reconhece um Gurgel: a empresa que produziu carros genuinamente brasileiros. Os modelos chamam atenção por onde passam até os dias de hoje, pelo estilo quadrado e mínimo. De econômicos a SUV, de jipes para o Exército Brasileiro a carros mini, e até mesmo o primeiro veículo elétrico da América Latina. A Gurgel Motores produziu mais de 40 mil veículos durante os seus 25 anos de existência.

Originais do Brasil, muito de seus carros ganharam nomes nacionais no idioma indígena tupi-guarani, como nos modelos Itaipu, Tocantis, Xavante, Carajás e Ipanema. Esta era uma característica da marca, ter um apelo nacionalista. Outro fato notório da Gurgel eram suas carrocerias de design únicos, todas originais criadas pela marca sem nenhum traço característico de influência dos modelos internacionais da época.
A simplicidade do interior dos veículos eram compensadas pela criatividade de seu exterior, os carros possuíam compartimentos especiais, pequenas portas que guardavam itens como pá, estepe, entre outros, como uma caixinha de surpresas. A marca criou carros com muitas versões e atrativos, como portas feitas de acrílico transparente, de teto removível, e sistema de ventilação direcionado a cada passageiro do carro. Estamos falando de pura criatividade!
HISTÓRIA
A Gurgel Motores começou projetando karts e mini carros para crianças, e logo evoluiu para tornar real o sonho de seu fundador, o engenheiro João Augusto Amaral Gurgel: produzir carros 100% nacionais. Em 1969 a Gurgel lançou o seu primeiro carro no mercado brasileiro, o buggy-utilitário Ipanema. Com carroceria do material criado e patenteado pela empresa, chamado “plasteeal“, uma mistura de plástico e aço de alta resistência. O motor e chassis usados na maioria dos carros eram Volkswagen. O carro teve quatro versões: Ipanema, Enseada, Augusta – uma versão mais luxuosa, e Xavante – o utilitário da Gurgel que foi um grande sucesso popular.

O mercado brasileiro respondeu positivamente aos carros da Gurgel Motores, os veículos fizeram sucesso principalmente em fazendas, competindo com o jeep, na época. O momento histórico era favorável as empresas nacionais, durante o período da Ditadura Militar, com restrição a importação de veículos automotores. A Gurgel reconheceu o seu potencial, abandonou o buggy em chassi Volkswagen e começou a produzir os seus próprios utilitários, como o motor Enertron, baseado no boxer VW, porém arrefecido a água. Eram fabricados 10 carros por dia, o modelo X-12 foi o produto principal da empresa. Cerca de 25% da produção da Gurgel era exportada para quase todos os países da América Latina e até mesmo para a Arábia Saudita, entre outros países.

MODELOS DE DESTAQUE
Xavante & X-12 (1973): Este foi o principal carro na linha de produção da história da Gurgel. O Xavante foi um sucesso. Caiu não só no gosto popular, como também no do exército brasileiro. O carro teve uma versão militar, exclusivo em dois modelos, o X-12 e o X-15. O Xavante foi feito de plasteel e fibra de vidro, considerado um utilitário, muito usado na cidade, o veículo também era útil para estradas precárias e off-road. Selectration: uma engenharia da Gurgel para compensar o fato de seus jeeps não terem tração nas quatro rodas, contavam então com o selectrarion, um modelo de bloqueio manual. Quando alguma das rodas patinava atolada em lama, o motorista poderia bloqueá-la por alavancas, passando a movimentar a roda oposta. Genial!

Itaipu & E-400 (1974): Este foi o primeiro carro elétrico da América Latina, chamado Itaipu, um minicarro urbano para dois passageiros. As baterias foram um empecilho para o projeto. Pouca durabilidade, capacidade e muito peso. A interessante proposta da Gurgel teve poucas unidades comercializadas, e serviu de base para o seu sucessor, o E-400. Um utilitário na versão de furgão e picape, feito de carroceria em fibra de vidro, com motor elétrico de 13,6 cv, atingindo até 80 km/h. A recarga variava entre 6 e 8 horas. O utilitário foi vendido em pequenas quantidades, principalmente para empresas estatais, auxiliando no transporte de funcionários.

XEF (1981): O primeiro minicarro urbano da Gurgel. Medindo 3,2 metros de comprimento, de motor Volkswagen e carburação dupla opcional a álcool ou gasolina. Apesar de pequeno era visto como um minisedan, com potência de 48cv, a sensação era de estar em um kart, grudado ao chão. O nome fazia uma sátira em referência aos “patrões” e seus espaçosos sedans da época.

Carajás (1984): Este foi um projeto de sucesso da Gurgel, visando um público mais exigente. O Carajás é um jipe grande, que chamava atenção pela beleza. Foi comercializado na versão básica e de luxo, com melhor estofado e vidros esverdeados. O carro oferecia motor a álcool, gasolina e diesel.

BR-800 (1988): O primeiro carro 100% nacional: chassi, carroceria e motor Gurgel. O modelo de 800 cilindradas, rendia 34 cv de potência. Um veículo urbano e econômico, para quatro passageiros. O BR-800 tinha na economia a sua maior aliada: fazia em média cerca de 21 km/l de gasolina na estrada, um número expressivo até para os dias de hoje. Posteriormente, o modelo foi engolido pela concorrência, devido à baixa do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para carros com motor menores que 1000cm³. O que levou, por exemplo, carros como o Fiat Uno Mille, ter o mesmo preço que o BR-800, porém com mais espaço e desempenho.


Motomachine (1990): “o smart brasileiro”, foi um protótipo de carro urbano apresentado pela Gurgel em meados de 90. Com espaço interno para duas pessoas, portas transparentes de acrílico e teto com capota de lona ou de fibra de vidro removível. O mini transparente conversível tinha um apelo futurístico e tinha uma proposta interessante, oferecer liberdade de estar dirigindo uma moto na segurança de um carro.



O FIM DA ESTRADA PARA A GURGEL MOTORES
A Gurgel Motores fechou as portas por falência em 1994. A empresa perdeu concorrência no mercado com a abertura para a importação no país. As multinacionais ofereciam por um preço equivalente aos Gurgel, carros mais espaçosos e com mais tecnologia. Até hoje esta é a marca de carros mais lembrada pelos brasileiros e, ainda é possível comprar e ver modelos da Gurgel rodando pelo Brasil.

Por Karina Salvador – Editorial Berlim